DOMlNGO DE RAMOS NA PAIXÃO DO SENHOR – 20/MARÇO/2016

a_EntradaDeJesusEmJerusalemIsaías 50,4-7; Sal 21,8-9.17-20.23-24; Filipenses 2,6-11; Lucas 22,14–23, 56

RECONFORTAR QUEM JÁ NÃO PODE MAIS – ( Is. 50,4c). Ao entrever a Paixão, Isaías põe na boca dO Servo das dores, palavras espantosas: “Para eu saber dar palavras de alento aos desanimados”. São palavras sem dúvida inesperadas pois sabemos como a nossa tendência natural será sempre – quando em sofrimento – dobrar-nos sobre nós mesmos, transformando-nos no centro do mundo. Quem, a não ser alguém que nunca tenha sofrido dolorosamente, ousará dizer a um homem em sofrimento que já não consegue aguentar mais: “Tu és um egoísta, só pensas em ti!” Os discípulos de Cristo não podem ficar por aqui. Mas, esta anomalia do Servo – relativamente às tendências naturais – é reveladora d’O Mistério de amor de um Deus que encarna para ser Redentor. A profecia de Isaías: “Deixei-me instruir pelo sofrimento para reconfortar quem já não pode mais”, refere-se aos sofrimentos da humanidade, desde as origens até ao final dos tempos. O reconforto anunciado não é mera palavra de encorajamento, é a Páscoa : a vida divina e eterna.

«NÃO A MINHA VONTADE, MAS A TUA…» ( Luc. 22,14–23,56). No relato da Paixão, Lucas apresenta Jesus como O justo inocente. Ele é muito respeitoso a Seu respeito e não diz nada sobre os escar- ros e as bofetadas dos guardas. A flagelação e a coroação de espinhos são apenas referidos como “castigos”. Inocente, Jesus não é surpreendido. Entrega-se no Horto das Oliveiras, e podia escapar. Mas Ele permaneceu livre e sem ódio. A Sua fidelidade aO Pai é total: “Pai, se quiseres, afasta de Mim este cálice ; porém, não seja feita a Minha vontade mas a Tua”. A celebração dos Ramos leva-nos a re-inventar palavras capazes de designarem, no nosso mundo, “Aquele que vem, O rei, em nome dO Senhor”. Aquele que vem, vem numa jumenta, montada de paz, e não num cavalo, montada de guerra. Discípulos de Jesus, somos portadores duma revelação extraordinária : Deus ama os homens, ao ponto de Se fazer um deles para destruir pelo interior a morte, consequência do pecado, e para tornar o homem capaz de amar como Ele. Hippolyte Flandrin (1809- 64) Nada se pode comparar a isto, em nenhuma outra reli- gião se revela um mistério semelhante a este : O Filho de Deus que Se faz homem, nascido um dia no tempo, morto na cruz noutro dia do tempo, e ressuscitado dos mortos ao terceiro dia! Nada! O que torna o cristianismo algo único. Na véspera da Páscoa, no evangelho de Lucas, Jesus envia os Seus discípulos em missão: “Está escrito que Cristo sofrerá, que ressuscitará de entre os mortos ao 3o dia, e que a conversão será proclamada em Seu nome, para o perdão dos pecados, a todas as nações, a começar por Jerusalém. Vós sois disto testemunhas.” (Luc.24,46-48). Assim, não é possível calar-nos. Por três vezes Pilatos afirma não encontrar “qualquer motivo de condenação” para mandar matar Jesus. Pilatos, o estrangeiro, reconhece a inocência de Jesus ! Em Lucas, Jesus não se preocupa consigo mas com os outros : os discípulos, as mulheres de Jerusalém, Pilatos, Simão de Cirene, os carrascos, o malfeitor crucificado. Lucas apresenta Jesus como modelo a seguir, como o modelo do mártir para os discípulos preseguidos. A salvação de Deus é, neste evangelho, uma ideia forte. O episódio do bom ladrão e a oração de Jesus pelos carrascos demonstram-no. Após a morte, Lucas nota que “toda a multidão que se reunira pelo espectáculo, observando o que se passava, regressava a bater no peito.” (Luc.23,48). A morte de Jesus diz respeitoa todos. A fé na Ressureição não apagou a lembrança dos sofrimentos de Jesus e da Sua morte. A Ressureição explica-se pela forma como Jesus viveu desde o nascimento até à cruz: sendo plenamente fiel a Seu Pai e entregando a própria vida por todos. A Cruz e a Ressureição são inseparáveis.

Meditações Bíblicas”, tradução dos Irmãos Dominicanos da Abadia de Saint-Martin de Mondaye (Suplemento Panorama, Edição Bayard, Paris). Selecção e síntese: Jorge Perloiro.